Para quem não sabe, Mayday é uma palavra-código para emergência, usada em todo o mundo nas comunicações emitidas por tripulantes de aeronaves ou de navios, quando estão em situação de risco.
Já MEI era uma sigla para MicroEmpreendedor Individual, um modelo empresarial simplificado para autônomos e pequenos empreendedores.
Eu disse “era” porque, desde que a nova vice-presidente de pessoas da Vale defendeu no início deste ano políticas de recursos humanos voltadas à meritocracia e excelência em contraposição a ações de diversidade, MEI também passou a significar Mérito, Excelência e Inteligência.
A executiva não agiu muito diferente de empresas como John Deere, Harley Davidson, Walmart, Meta, Amazon, Target, Google, Accenture, entre muitas outras que reposicionaram suas iniciativas de DEI, sigla para Diversidade, Equidade e Inclusão, corroborando de alguma forma o que ela postou numa rede social, qual seja, que a cultura woke estaria perdendo espaço para o mérito, a excelência e a inteligência.
Na descrição o menos enviesada possível – espero -, o movimento woke significa “acordado” e remete a uma consciência social voltada para injustiças relacionadas a raça, gênero, orientação sexual e outras formas de opressão. Junto com ele, surgiu o identitarismo, que se propõe a valorizar e afirmar identidades sociais (como raça, gênero e orientação sexual), buscando reconhecimento e reparação de desigualdades históricas.
O que pode estar por trás desse aparente retrocesso?
A ênfase em identidades pode criar divisões dentro das empresas e da sociedade, gerando conflitos internos entre grupos diferentes e dificultando um senso de coletividade.
Políticas afirmativas podem levar a contratações e promoções baseadas em critérios identitários, em vez de mérito e competências técnicas, o que, para alguns, pode afetar a performance e os resultados organizacionais.
Algumas políticas de DEI têm sido contestadas legalmente, com alegações de discriminação reversa e imposição de ideologias, resultando em batalhas judiciais e revisão de estratégias.
Como escrevi, estas são apenas possibilidades por trás desse fenômeno. Mas o que me chama mais atenção não é a reflexão sobre elas. Pelo contrário, vejo como algo extremamente saudável pensar sobre possíveis efeitos colaterais de um movimento recente e que, na sua ânsia de corrigir desigualdades, pode também estar contribuindo para a construção de muros e não apenas pontes.
O que me chama a atenção mais do que tudo é a contraposição: “sai o DEI e entra (de novo) o MEI”.
Por que não os dois?
É como se nós aqui do Age Free World culpássemos os mais novos pelo preconceito sofrido pelos mais velhos. Ou o contrário.
O que há de errado em uma organização focar tanto a Diversidade, Equidade e Inclusão quanto o Mérito, Excelência e Inteligência?
Por que esses termos foram colocados como inimigos?
Minha tese é simples – diria até simplista – e fruto apenas de minha observação.
Numa sociedade que se acostumou a ter sempre que escolher um lado – o pensador Augusto de Franco descreve esse comportamento como doença, o “ladismo” – e que faz essa escolha por meio de uma reação emocional, acionada instintivamente para defender a própria identidade, integrar MEI e DEI parece um ato utópico, ignorante ou inconsequente.
Quem prega essa tese esquece-se, no entanto, que, para navegar e evoluir na complexidade, precisamos, mais do que nunca, usar exaustivamente e com muita inteligência nossa capacidade criativa – sim, temos essa core skill instalada de fábrica – para lidar com um mundo cada vez mais VUCA (Volátil, Incerto, Complexo e Ambíguo) ou, para atualizar a sigla, um mundo cada vez mais BANI (Brittle/Frágil, Ansioso, Não Linear e Incompreensível).
Se não usarmos esse superpoder de nossa mente cognitiva, que basicamente está por trás de nossa evolução de hominídeos primitivos ao Homo Sapiens, aí sim estaremos em apuros.
Porque, de todas as escolhas, emburrecer certamente não está entre as melhores.
P.S.: Fazendo justiça, escutei pela primeira vez a expressão MEIDEI, que se propõe a integrar as duas siglas, ao invés de contrapô-las, do Vicente Gomes, um de meus sócios na Corall.